São quatro meses e 29 dias dedicados exclusivamente ao pagamento de tributos aos governos federal, estadual e municipal. Isso significa que 40,82% da renda média anual do brasileiro será destinada ao financiamento do setor público

O brasileiro precisou trabalhar até a última quinta-feira, 29 de maio, apenas para quitar impostos, taxas e contribuições devidos aos governos federal, estadual e municipal. Na prática, são 149 dias – ou 40,82% da renda média anual – destinados exclusivamente ao pagamento de tributos. Os dados fazem parte do estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), que analisou a carga tributária incidente sobre renda, consumo e patrimônio no país. No ano ado, essa conta também chegou a 149 dias.
Mesmo com esse esforço, o retorno em serviços públicos ainda está entre os piores do mundo. O Brasil segue na última posição do Índice de Retorno de Bem-Estar à Sociedade (IRBES) – lista com 30 países com as maiores cargas tributárias –, também elaborado pelo IBPT, que mede o que a população recebe de volta em áreas como saúde, educação e segurança, proporcionalmente ao que paga em impostos.
Para o advogado tributarista Samir Nemer, sócio-fundador do FurtadoNemer Advogados, os dados confirmam um desequilíbrio persistente entre arrecadação e contrapartida. “O contribuinte brasileiro trabalha praticamente cinco meses por ano apenas para sustentar a máquina pública, sem ver retorno compatível. Essa desconexão entre o que se paga e o que se recebe mina a confiança nas instituições e aprofunda a desigualdade”, afirmou o especialista, que é mestre em Direito Tributário.

Levantamento
De acordo com o levantamento, o número de dias trabalhados para pagar tributos em 2025 foi influenciado principalmente por três fatores: o fim de desonerações fiscais, a reoneração da folha de pagamento para 17 setores econômicos e o aumento das alíquotas do ICMS em diversos estados. Desde abril, estados como Minas Gerais, Bahia e Ceará aram a cobrar 20% de ICMS, medida que visa garantir maior participação futura na arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), previsto na reforma tributária.
Outro fator foi a tributação de remessas internacionais de até 50 dólares, por meio do programa Remessa Conforme, que elevou a arrecadação em 0,46 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB). Além disso, o aumento recente do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) adicionou quatro dias de trabalho à conta dos contribuintes, de acordo com o IBPT.
Hoje se trabalha mais do que os anos 1870 para sustentar o Governo
“Hoje, trabalhamos mais que o dobro do que se trabalhava nos anos 1970 só para sustentar o governo. O Brasil cobra como país rico, mas entrega serviços de país pobre”, criticou João Eloi Olenike, presidente executivo do IBPT. Ele lembra que em países desenvolvidos com cargas tributárias elevadas, como Dinamarca ou Alemanha, a população recebe serviços públicos de qualidade, mas no Brasil isso não acontece.
Em 1970, o brasileiro trabalhava, em média, 76 dias por ano para pagar tributos. Nos anos 2000, essa média aumentou para 138 dias, e, nesta década, a média já chegou a 153 dias.
Cinco meses
Ainda segundo o estudo, os brasileiros de menor renda (até R$ 3.000 mensais) precisaram trabalhar até 29 de maio para pagar tributos. Já a classe média (entre R$ 3.000 e R$ 10.000) encerraram esse ciclo em 22 de maio. Para os que ganham acima de R$ 10.000, o prazo vai até 5 de junho, reflexo da maior incidência do Imposto de Renda sobre essa faixa.
“É urgente discutir não apenas a simplificação do sistema tributário, como propõe a reforma tributária, mas também a eficiência no uso dos recursos arrecadados. Um país que consome 40% da renda da população precisa justificar cada centavo investido”, reforçou Samir Nemer.
Os tributos sobre bens de consumo continuam a ser os mais onerosos, segundo o IBPT, representando 22,73% da carga tributária, o que equivale a 83 dias de trabalho. Os impostos de renda, como o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), corresponde a 15,06%, ou 55 dias de trabalho.
Já os tributos sobre o patrimônio, como Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), representam 3,03%, o que significa 11 dias de trabalho. Somando tudo, a carga tributária do Brasil chega aos 40,82% da renda do cidadão, ou 149 dias do ano.
Reforma tributária
A reforma tributária trará uma importante inovação para o consumidor: a obrigatoriedade de informações claras na nota fiscal sobre os tributos que compõem o preço final de produtos e serviços.
A nova regra exigirá que estejam destacados, no documento fiscal, os valores nominais e os percentuais do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto Seletivo, quando aplicável. A medida valerá em todas as etapas da cadeia, mas terá impacto direto na relação com o consumidor final, que ará a visualizar, de forma objetiva, quanto paga em tributos.
O objetivo é ampliar a transparência, conscientizar a população sobre a carga tributária real e reduzir a margem para abusos por parte de empresas que hoje se beneficiam da complexidade do sistema.
“A transparência na nota fiscal é um o essencial para que o cidadão entenda o verdadeiro peso dos tributos no seu dia a dia, fortalecendo o controle social sobre a carga tributária”, afirmou o advogado tributarista Samir Nemer.
O estudo do IBPT
O estudo do IBPT cobre o período de maio de 2024 a abril de 2025 e inclui todos os tributos diretos e indiretos, como Imposto sobre Produtos Industrializados (ICMS), Imposto sobre Serviços (ISS), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), IPVA, IPTU, IRPF, entre outros.